Arão Dava*
A crise dos EUA, pegou de surpresa mesmo aos mais atentos analistas das Relações Internacionais. As questões que me incomoda é, estaremos perante a crise do paradigma liberal? Ou estaremos perante a emergência de um novo paradigma?
O paradigma constitui um pressuposto filosófico, matriz, ou seja, um conhecimento que origina o estudo de um campo científico; uma realização científica com métodos e valores que são concebidos como modelo; uma referência inicial como base de modelo para estudos e pesquisas.
As várias áreas de conhecimento, incluindo as Relações Internacionais, tomaram de empréstimo o conceito paradigma, do físico americano Thomas Kuhn, (1922 - 1996), celebre por suas contribuições à história e filosofia da ciência em especial do processo (revoluções) que leva a evolução do desenvolvimento científico, designou como paradigmáticas as realizações científicas que geram modelos que, por período mais ou menos longo e de modo mais ou menos explícito, orientam o desenvolvimento posterior das pesquisas exclusivamente na busca da solução para os problemas por elas suscitados.
No livro “A estrutura das Revoluções Científicas”, Tomas Kuhn apresenta a concepção de que “um paradigma, é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma”, p. 219 e define “o estudo dos paradigmas como o que prepara basicamente o estudante para ser membro da comunidade científica na qual actuará mais tarde”, p. 31.
Desde os finais da década de 80 do século passado, a democracia liberal e o capitalismo, vinham sendo tidos como dominantes, isto é, paradigmas, sob ponto de vista ideológico, académico e político-económico e militar. Quer dizer que a democracia liberal e o capitalismo eram promovido sobretudo por académicos e lideres políticos ocidentais, como únicas alternativas ao desenvolvimento e às relações internacionais. Uma das manifestações mais emblemáticas dessa ofensiva foi, a publicação em 1989 do artigo, "O fim da história" e, posteriormente, lançamento do livro “O fim da história e o último homem”, em 1992, ambos do norte-americano Francis Fukuyama. O esforço principal de Fukuyama, foi o de tentar elaborar uma linha de abordagem da história, indo de Platão a Nietzsche e passando por Kant e Hegel, a fim de revigorar a tese de que o capitalismo e a democracia burguesa constituem o ponto mais alto da evolução da história da humanidade, ou seja, de que a humanidade teria atingido, no final do século XX, o ponto culminante de sua evolução com o triunfo da democracia liberal ocidental sobre todos os demais sistemas e ideologias concorrentes.
Tal como defendeu Fukuyama, o sec passado viu, primeiramente, a destruição do fascismo e, em seguida, do socialismo, que fora o grande adversário do capitalismo e do liberalismo no pós-guerra. O mundo teria assistido ao fim e ao descrédito dessas duas alternativas globais, restando apenas, actualmente, em oposição à proposta capitalista liberal, resíduos de nacionalismo, sem possibilidade de significarem um projecto para a humanidade, e o fundamentalismo islâmico, confinado ao Oriente e a países periféricos. Assim, com a derrocada do socialismo, Fukuyama conclui que a democracia liberal ocidental firmou-se como a solução final do governo humano, significando, nesse sentido, o "fim da história" da humanidade.
Ao que parece a abordagem histórica de Francis Fukuyama foi precipitada na medida em que, recorrendo a Platão a Nietzsche e passando por Kant e Hegel ignorou outras realidades, como diria mais tarde em reacção, Samuel P. Huntington na obra, Choque de civilizações. Basicamente segundo Huntington as identidades culturais e religiosas dos povos serão a principal fonte de conflito no mundo pós-Guerra Fria. Aliás para Huntigton
Minha hipótese é que a fonte fundamental de conflitos neste mundo novo não será principalmente ideológica ou económica. As grandes divisões entre a humanidade e a fonte dominante de conflitos será cultural. Os Estados-nações continuarão a ser os actores mais poderosos no cenário mundial, mas os principais conflitos da política global ocorrerão entre países e grupos de diferentes civilizações. O choque de civilizações dominará a política global. As falhas geológicas entre civilizações serão as frentes de combate do futuro.( Cópia oficial (em inglês): The Clash of Civilizations?, Foreign Affairs, verão de 1993
Os resíduos do nacionalismo e o fundamentalismo, apontados por Fukuyama como “oposição insignificante ao capitalismo liberal”, constituem hoje ameaças significantes com fortes possibilidades resultarem no chamado Spillover effect podendo aumentar o número de adeptos. Não seria dificil encontrar exemplos de nacionalismos e fundamentalismos que constituem grande ameaça para os EUA, basta olhar para os casos da Venezuela, Coreia do Norte, Irão, Afeganistão notaremos que outras alternativas ao capitalismo liberal são tidas em conta e defendidas como valores em muitos cantos do globo.
Mas o propósito deste artigo, não é certamente discutir as falhas de Huntigton ou de Fukuyama. Mas responder a questão, estaremos perante a crise do paradigma liberal? Ou estaremos perante a emergência de um novo paradigma? A resposta tem como base alguns sinais no sistema internacional.
- A “mão invisível “ está demasiado descontrolada de tal forma que ela começa a tomar conta da liberdade económica e politica do indivíduo, isto é, o indivíduo perde a sua liberdade a favor do mercado. Se a idéia da mão invisível é melhor a situação por exemplo dos pobres numa economia equilibrada e sustentável, tal não está a acontecer.
- O modelo escolhido e defendido pelo China está a aumentar a sua legitimidade como alternativa, na medida em que, por exemplo actual crise norte americana não teria os mesmo efeitos na China, ja que as empresas estratégicas estão nas maos do Estado e são contraladas.
- A solução encontrada pelo ocidente no geral é nacionalizar ou subsidiar aos bancos em falência, ora este é o modo de agir típico do socialismo.
Estes cenários meramente económicos estão a encontrar suporte em outros domínios que afectam as democracias liberais como são os casos :
- Crise da oposição – Em vários países começa a ser tomada a sério a possibilidade de existência pelo menos na pratica de apenas um partido governante sem possibilidade de alternativa e alternancia. Moçambique, Angola e Africa do sul, são exemplo claros da fragilização de oposição e da transformação do partido dominante em partido nacional.
- Referencia da Russia – A Russia reaparece no cenario politico internacional como mais um poder desafiante ao centro. A invasão ao Geogia e exercicios militares com a Venezuela, o apoio militar a Etiopia são sinais que claramente desafiam o ocidente, sobretudo os EUA.
- O crescimento económico da China.
A minha hipóteses é de que estamos perante a emergência de um novo paradima, ideológico que ira orientar o mundo sob ponto de vista ideológico.
Não sei como chamarei este paradigma, novo mas certamente, que agora sim, chegamos ao fim da história, na sequência de um casamento entre o capitalismo e o socialismo – mais ou menos no estilo chinês. Nada será como antes.
*Arão Dava é jornalista, graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo Instituto Superior De Relações Internacionais e membro-fundador da Associação de Jornalistas Pró-direitos Humanos e Cidadania (Moçambique).
O paradigma constitui um pressuposto filosófico, matriz, ou seja, um conhecimento que origina o estudo de um campo científico; uma realização científica com métodos e valores que são concebidos como modelo; uma referência inicial como base de modelo para estudos e pesquisas.
As várias áreas de conhecimento, incluindo as Relações Internacionais, tomaram de empréstimo o conceito paradigma, do físico americano Thomas Kuhn, (1922 - 1996), celebre por suas contribuições à história e filosofia da ciência em especial do processo (revoluções) que leva a evolução do desenvolvimento científico, designou como paradigmáticas as realizações científicas que geram modelos que, por período mais ou menos longo e de modo mais ou menos explícito, orientam o desenvolvimento posterior das pesquisas exclusivamente na busca da solução para os problemas por elas suscitados.
No livro “A estrutura das Revoluções Científicas”, Tomas Kuhn apresenta a concepção de que “um paradigma, é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma”, p. 219 e define “o estudo dos paradigmas como o que prepara basicamente o estudante para ser membro da comunidade científica na qual actuará mais tarde”, p. 31.
Desde os finais da década de 80 do século passado, a democracia liberal e o capitalismo, vinham sendo tidos como dominantes, isto é, paradigmas, sob ponto de vista ideológico, académico e político-económico e militar. Quer dizer que a democracia liberal e o capitalismo eram promovido sobretudo por académicos e lideres políticos ocidentais, como únicas alternativas ao desenvolvimento e às relações internacionais. Uma das manifestações mais emblemáticas dessa ofensiva foi, a publicação em 1989 do artigo, "O fim da história" e, posteriormente, lançamento do livro “O fim da história e o último homem”, em 1992, ambos do norte-americano Francis Fukuyama. O esforço principal de Fukuyama, foi o de tentar elaborar uma linha de abordagem da história, indo de Platão a Nietzsche e passando por Kant e Hegel, a fim de revigorar a tese de que o capitalismo e a democracia burguesa constituem o ponto mais alto da evolução da história da humanidade, ou seja, de que a humanidade teria atingido, no final do século XX, o ponto culminante de sua evolução com o triunfo da democracia liberal ocidental sobre todos os demais sistemas e ideologias concorrentes.
Tal como defendeu Fukuyama, o sec passado viu, primeiramente, a destruição do fascismo e, em seguida, do socialismo, que fora o grande adversário do capitalismo e do liberalismo no pós-guerra. O mundo teria assistido ao fim e ao descrédito dessas duas alternativas globais, restando apenas, actualmente, em oposição à proposta capitalista liberal, resíduos de nacionalismo, sem possibilidade de significarem um projecto para a humanidade, e o fundamentalismo islâmico, confinado ao Oriente e a países periféricos. Assim, com a derrocada do socialismo, Fukuyama conclui que a democracia liberal ocidental firmou-se como a solução final do governo humano, significando, nesse sentido, o "fim da história" da humanidade.
Ao que parece a abordagem histórica de Francis Fukuyama foi precipitada na medida em que, recorrendo a Platão a Nietzsche e passando por Kant e Hegel ignorou outras realidades, como diria mais tarde em reacção, Samuel P. Huntington na obra, Choque de civilizações. Basicamente segundo Huntington as identidades culturais e religiosas dos povos serão a principal fonte de conflito no mundo pós-Guerra Fria. Aliás para Huntigton
Minha hipótese é que a fonte fundamental de conflitos neste mundo novo não será principalmente ideológica ou económica. As grandes divisões entre a humanidade e a fonte dominante de conflitos será cultural. Os Estados-nações continuarão a ser os actores mais poderosos no cenário mundial, mas os principais conflitos da política global ocorrerão entre países e grupos de diferentes civilizações. O choque de civilizações dominará a política global. As falhas geológicas entre civilizações serão as frentes de combate do futuro.( Cópia oficial (em inglês): The Clash of Civilizations?, Foreign Affairs, verão de 1993
Os resíduos do nacionalismo e o fundamentalismo, apontados por Fukuyama como “oposição insignificante ao capitalismo liberal”, constituem hoje ameaças significantes com fortes possibilidades resultarem no chamado Spillover effect podendo aumentar o número de adeptos. Não seria dificil encontrar exemplos de nacionalismos e fundamentalismos que constituem grande ameaça para os EUA, basta olhar para os casos da Venezuela, Coreia do Norte, Irão, Afeganistão notaremos que outras alternativas ao capitalismo liberal são tidas em conta e defendidas como valores em muitos cantos do globo.
Mas o propósito deste artigo, não é certamente discutir as falhas de Huntigton ou de Fukuyama. Mas responder a questão, estaremos perante a crise do paradigma liberal? Ou estaremos perante a emergência de um novo paradigma? A resposta tem como base alguns sinais no sistema internacional.
- A “mão invisível “ está demasiado descontrolada de tal forma que ela começa a tomar conta da liberdade económica e politica do indivíduo, isto é, o indivíduo perde a sua liberdade a favor do mercado. Se a idéia da mão invisível é melhor a situação por exemplo dos pobres numa economia equilibrada e sustentável, tal não está a acontecer.
- O modelo escolhido e defendido pelo China está a aumentar a sua legitimidade como alternativa, na medida em que, por exemplo actual crise norte americana não teria os mesmo efeitos na China, ja que as empresas estratégicas estão nas maos do Estado e são contraladas.
- A solução encontrada pelo ocidente no geral é nacionalizar ou subsidiar aos bancos em falência, ora este é o modo de agir típico do socialismo.
Estes cenários meramente económicos estão a encontrar suporte em outros domínios que afectam as democracias liberais como são os casos :
- Crise da oposição – Em vários países começa a ser tomada a sério a possibilidade de existência pelo menos na pratica de apenas um partido governante sem possibilidade de alternativa e alternancia. Moçambique, Angola e Africa do sul, são exemplo claros da fragilização de oposição e da transformação do partido dominante em partido nacional.
- Referencia da Russia – A Russia reaparece no cenario politico internacional como mais um poder desafiante ao centro. A invasão ao Geogia e exercicios militares com a Venezuela, o apoio militar a Etiopia são sinais que claramente desafiam o ocidente, sobretudo os EUA.
- O crescimento económico da China.
A minha hipóteses é de que estamos perante a emergência de um novo paradima, ideológico que ira orientar o mundo sob ponto de vista ideológico.
Não sei como chamarei este paradigma, novo mas certamente, que agora sim, chegamos ao fim da história, na sequência de um casamento entre o capitalismo e o socialismo – mais ou menos no estilo chinês. Nada será como antes.
*Arão Dava é jornalista, graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo Instituto Superior De Relações Internacionais e membro-fundador da Associação de Jornalistas Pró-direitos Humanos e Cidadania (Moçambique).
Sem comentários:
Enviar um comentário