Josué Bila
Quase um mês depois da comemoração do 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), o diário Canal de Moçambique noticiou a oito de Janeiro que o Tribunal da capital moçambicana, Maputo, condenou a empresa de segurança privada Wackenhut Moçambique, Lda, a pagar uma indemnização de 9.486.448,53 Meticais a trezentos trabalhadores, por a firma ter unilateralmente rescindido os seus contratos de trabalho. O jornal, citando um documento do Ministério do Trabalho (MITRAB), aponta ainda que a entidade empregadora, em referência, violou a Lei de Trabalho e muitos outros aspectos contratuais, em prejuízo dos trabalhadores. Nisso, o patronato foi chamado à atenção; porém, não cumpriu com as determinações do MITRAB, antes que este, juntamente com os trabalhadores, accionasse mecanismos para que o caso desembocasse em tribunal.
Que se pode dizer deste caso?
Ora, num país como Moçambique em que as injustiças laborais atingem a lua, há que comemorar essa deliberação do tribunal a favor de três centenas de trabalhadores, por quatro razões:
1 – Os conteúdos do Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH)e da Constituição da República de Moçambique (CRM) conheceram o seu cumprimento material;
2 – O tribunal deu um passo gigantesco, no respeito aos códigos do Estado de Direito Democrático, mostrando um dos seus valores: independência do Poder Judicial;
3 – O tribunal mostrou que a força do direito dos direitos humanos deve prevalecer, reconhecendo o direito das vítimas, em detrimento do direito da força dos poderosos, sempre prontos para manipular e corromper a ética judicial e do Estado, a seu favor; e
4 – O Ministério do Trabalho, enquanto Governo, mostrou comprometimento para com os direitos dos trabalhadores.
Direitos humanos e tribunais
O Direito Internacional dos Direitos Humanos e a CRM determinam princípios, direitos e garantias que asseguram a dignidade humana, declarando que os direitos humanos não fossem violados. Porém, quando violados, existem tribunais, para oferecerem remédios às vítimas, tal como (in)esperadamente aconteceu àqueles trabalhadores.
Assim, os artigos 8* da DUDH e 70* da CRM, respectivamente, são uma expressão clara do interesse internacional e doméstico em assegurar os direitos humanos de todos, sendo que a reparação legal, deliberada por tribunais independentes, é um dos meios.
Por isso, a indemnização àqueles trabalhadores transparece o seguinte: se a independência do Poder Judicial e as acções governamentais estiverem comprometidas e entronizadas com a justiça social e dignidade humana dos trabalhadores e demais pessoas, a realização do sonho ético plasmado nos documentos de direitos humanos é possível.
A realização deste sonho – reparação judicial e acções governamentais de justiça social - é complexa e urgente. Sua complexidade reside na fraca cobertura dos tribunais em qualidade e quantidade, número bastante reduzido de juízes e outros agentes judiciais e advocatícios, lentidão nos processos e julgamentos, corrupção e cultura de vitimar os indefesos. Sua urgência consiste na flexibilização para a reparação das injustiças de que os moçambicanos e trabalhadores são vítimas, quer tendo acesso ao tribunal formal, quer não. Aliás, a maior parte da nossa população não tem acesso a tribunais formais, vivendo em injustiças cometidas pelo Estado ou por agentes poderosos, como a Wackenhut.
Extensivamente, pode-se dizer que esta vitória dos trabalhadores, Judiciário e Ministério do Trabalho precisa acontecer diariamente no país, a avaliar pelas injustiças laborais de que os empregados sofrem. Vejo, aqui, uma acção tri-partida. Os trabalhadores denunciaram a violação de seus legítimos direitos pelo patronato ao MITRAB. Este, por sua vez, inspeccionou e interveio. Observou que, de facto, a denuncia dos trabalhadores era factual. Entretanto, accionou mecanismos até que o caso caísse em tribunal. O tribunal julgou procedente a causa dos trabalhadores, tendo mandado a empresa para ressarci-los. É isto que os trabalhadores e moçambicanos precisam dos tribunais. Apenas Justiça, quando injustiçados pelos poderosos económico-empresariais e outros agentes e autoridades detentoras de Poder.
Por último, uma vez que a justiça foi feita, há que comemorar a força dos direitos humanos, por ser um alto padrão de ética secular, pelo qual devemos caminhar.
*Toda a pessoa tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédios efectivos para os actos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição.
**O cidadão tem o direito de recorrer aos tribunais contra os actos que violem os seus direitos e interesses reconhecidos pela Constituição e pela Lei.
São Paulo, 10 de Janeiro de 2009
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